Arraste-me Para o Inferno

por
  • RENATO SILVEIRA em
  • 18 agosto 2009



  • Em tempos em que “filme de terror” virou sinônimo de “filme violento”, graças ao sucesso da franquia “Jogos Mortais” e à ascenção da chamada “torture-porn”, ver o horror à moda antiga que Sam Raimi promove em “Arraste-me Para o Inferno” é, no minímo, reconfortante. Na verdade, dizer “à moda antiga” é até certo exagero (ou uma justificativa para meus primeiros fios de cabelo branco). O que Raimi faz é apenas voltar às origens do cinema que o influenciou nos anos 70 e que ele praticava nos anos 80, quando se lançou como cineasta com o já clássico “Evil Dead – A Morte do Demônio”, de 1981.

    Como tudo naquela época relacionado ao cinema de entretenimento, o terror era um gênero extravagante, que abusava da fantasia e do sobrenatural em tramas que foram filmadas por David Cronenberg, Wes Craven, John Carpenter, Joe Dante, Tobe Hooper, Tom Holland, além do próprio Raimi, entre outros - sem falar nos efeitos especiais e de maquiagem engenhosos que resultaram em imagens inesquecíveis nas mãos de talentos como Stan Winston, Tom Savini, Rick Baker, Chris Walas e Dick Smith. E já que a proposta é fazer esse resgate, um dos aspectos de “Arraste-me Para o Inferno” em que Raimi poderia ter investido mais é justamente o uso dos efeitos práticos, realizados no set com maquiagem, bonecos animatrônicos e tudo mais.

    Percebe-se que muito do que está em cena é real, mas certas sequências não escapam da aparência fake que a computação gráfica quase sempre deixa transparecer. Os efeitos de antigamente (essa palavra de novo) certamente também não pareciam verdadeiros, mas só o fato de você saber que os atores interagiram de verdade com bonecos ou cenários torna a coisa toda mais bem mais verossímil do que qualquer truque de CGI. Veja por exemplo a cena em que a bruxa ataca a personagem de Alison Lohman em uma despensa. Raimi faz tudo certo com a câmera, mas se os efeitos visuais tivessem sido feitos no set, provavelmente a cena pareceria melhor, ainda que você percebesse a presença do latex sobre a pele das atrizes.

    Felizmente, Raimi só recorre à computação nas cenas mais “complexas”, já que, na maior parte do filme, as gosmas e o sangue falso são fluidos como devem ser. E que maravilha é o banho de lama que Lohman toma em certo ponto. Raimi sabe a boa atriz que tem na frente da câmera e não hesita em valorizar suas expressões faciais em tomadas fixas no rosto da moça. E Lohman demonstra estar se divertindo à beça: grita, xinga, faz caretas, mergulha de cabeça no espírito da brincadeira e ri do cinismo de sua personagem – uma jovem funcionária de banco que, para ganhar uma promoção, nega uma extensão de empréstimo para uma velhinha que está para ser despejada.

    Em época de crise financeira, existe a leitura de que Raimi faz uma sátira social (e bem-vinda, por que não?). Mas isso é só subtexto. Na verdade, o que temos aqui é um cineasta que parece estar cansado de filmar o Homem-Aranha e resolve abrir o baú para relembrar os velhos tempos. Faz bem, e também o faz a Universal Pictures, que acredita no projeto e permite-se brincar, utilizando seu clássico logotipo de abertura dos anos 80, assim como aquela “placa” que surgia após os créditos para convidar o espectador a visitar o parque-temático do estúdio na Califórnia.

    Ao mesmo tempo em que faz vários de seus planos-assinatura, Raimi claramente presta uma homenagem a cineastas que o inspiraram, como Dario Argento, Roman Polanski e William Friedkin, não só esteticamente, mas também na forma metade sarcástica, metade nevrálgica com que trata assuntos hoje pouco usados em filmes de horror, como bruxaria, magia negra, possessões e exorcismos.

    Por sinal, a trilha sonora traz o tema não utilizado de “O Exorcista”, composto por Lalo Schifrin, além de trechos de composições obscuras de Ennio Morricone misturadas ao score original de Christopher Young. E não se pode esquecer ainda do ótimo trabalho sonoro do filme que, junto com a precisão da montagem, prega aqueles famosos sustos na platéia a cada carta na manga que o bem amarrado roteiro guarda.

    Para quem é fã de verdade de terror, “Arraste-me Para o Inferno” é um passeio obrigatório e infalível.

    nota: 8/10 -- veja no cinema e compre o DVD

    Arraste-me Para o Inferno (Drag Me to Hell, 2009, EUA)
    direção: Sam Raimi; roteiro: Sam Raimi, Ivan Raimi; fotografia: Peter Deming; montagem: Bob Murawski; música: Christopher Young; produção: Grant Curtis, Sam Raimi, Robert G. Tapert; com: Alison Lohman, Justin Long, Lorna Raver, Dileep Rao, David Paymer, Adriana Barraza, Chelcie Ross, Reggie Lee, Molly Cheek; estúdio: Buckaroo Entertainment, Ghost House Pictures, Mandate Pictures, Tippett Studio; distribuição: Universal Pictures. 99 min

    2 comentários:

    Silvino disse...

    Senti a mesma coisa quando vi. Bom filme, mas os efeitos práticos fizeram falta.

    Flávio disse...

    Filme muito divertido!!! Há tempos que não via um filme tão divertido quanto esse. Momentos de terror muito bons, mas momentos de humor inacreditáveis e simplesmente geniais! A cena da luta contra a velha no carro já é uma das coisas mais deliciosas do ano. A trilha e os efeitos sonoros absurdamente altos são geniais.

     
    Copyright (c) 2010 Blogger templates by Bloggermint