O Artista

por
  • RENATO SILVEIRA em
  • 15 fevereiro 2012



  • Quando eu soube que "O Artista" era um filme mudo, logo suspeitei de tudo não passar de uma desculpa para usar o formato apenas para fazer um filme à moda antiga nos dias de hoje. Felizmente, não se trata disso.

    Michel Hazanavicius já havia demonstrado carinho por um passado cinematográfico com os filmes do Agente 117 (ele dirigiu dois: um em 2006 e outro em 2009, ambos também com os atores Juan Dujardin e Bérénice Bejo; o mais recente inclusive se passa no Brasil, mas não foi lançado aqui). Em "O Artista", ele volta ainda mais no tempo, mas a graça toda do filme é que o cineasta não está só emulando o cinema mudo.

    A revelação se dá numa sequência de sonho do protagonista (Dujardin), um astro dos filmes da época, fim dos anos 20, que se vê surpreendido pela decisão dos estúdios em aposentá-lo dado o advento do cinema falado. Até ali, "O Artista" parece mesmo só imitar um filme mudo, mas Hazanavicius usa com inteligência a metalinguagem para mostrar a quê realmente seu filme veio.

    Ao mesmo tempo em que é uma homenagem, "O Artista" é um comentário sobre a troca de tecnologias e a sobreposição do mais novo sobre o consagrado.

    Primeiro, temos um modo de fazer cinema que é abandonado pelo estúdio e pelo público por uma razão meramente tecnológica e mercadológica (o simples ato de falar, o diálogo "físico", digamos, como fica claro, não é uma necessidade para se narrar um bom filme).

    Depois, temos o ator, moeda do estúdio que se desvaloriza com a idade. Ele é substituído pela atriz em ascensão (Bejo), uma oportunista inicial que é vista como "carne nova" pelo chefão do estúdio (John Goodman) por se dar melhor com a fala do que o personagem de Dujardin - embora nunca escutemos o som da voz dela, em mais uma sacada metalinguística de Hazanavicius.

    Ou seja, é um filme sobre o som - melhor dizendo, um filme mudo sobre a necessidade da fala. No fim, um filme sobre narrativa.

    “O Artista” é, portanto, um filme sobre filmes. Mas, mais que fazer uma homenagem, com direito ao bom humor que conhecemos de Charles Chaplin e Buster Keaton (mais de Chaplin, talvez), ele coloca em perspectiva a evolução do próprio cinema como arte e como negócio. O que serve à transição do filme mudo para o filme falado, cabe ao preto-e-branco para o colorido, à película para o digital, ao 2D para o 3D. Parece filme antigo, mas é atualíssimo.


    O ARTISTA (The Artist, 2011, França/Bélgica). Direção: Michel Hazanavicius. Roteiro: Michel Hazanavicius . Fotografia: Guillaume Schiffman. Montagem: Anne-Sophie Bion, Michel Hazanavicius. Música: Ludovic Bource. Produção: Thomas Langmann, Emmanuel Montamat. Com: Jean Dujardin, Bérénice Bejo, John Goodman, James Cromwell, Penelope Ann Miller, Missi Pyle. Distribuição: Paris Filmes. 100 min

    2 comentários:

    Márcio Sallem disse...

    As sacadas do Hazanavicius são muitos inteligentes, desde a cena de abertura no filme dentro do filme quando George Valentine recusa-se a "falar" um segredo, embora torturado, e outras sacadas divertidas e oportunas, como a irônica vontade do Valentin de que seu cachorro falasse ou o letreiro "Bang!" no final que poderia significar muita coisa.

    Metalinguístico, nostálgico e apaixonante.

    Lana disse...

    Esse filme é adorável!! Muito bom trabalho do ator John Goodman assim com em Treme, essa série cujo enredo acho super interessante, a forma como eles mostram a luta dos cidadãos para recuperar suas vidas, suas casas, sua cidade com a ajuda da música. Estou muito ansiosa pelo início da 3ª temporada.

     
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