I wanna have control.
- Thom Yorke
Sites de relacionamento, ou redes sociais como também são conhecidos o Orkut, o Twitter, o MySpace e o Facebook, se tornaram extremamente populares ao longo dos últimos seis, sete anos. Tudo graças às facilidades que essas ferramentas proporcionam quando o objetivo do internauta é saber quem é uma pessoa, sem precisar ser apresentado a ela ou mesmo estar online ao mesmo tempo que ela. Ver fotos, saber onde e com o quê ela trabalha, de qual cor, quais filmes, quais músicas ela gosta. E, claro, saber qual é o seu status de relacionamento: solteira, casada, num rolo?
É essa curiosidade juvenil, que surge quando ainda estamos na escola - o útero da vida social - que motivou Mark Zuckerberg a criar o Facebook, um dos principais sites de relacionamento da atualidade, que começou como uma rede de contatos entre universitários nos Estados Unidos e, hoje, conta com mais de 500 milhões de usuários em todo o mundo. Em "A Rede Social", conhecemos os bastidores da criação do Facebook, que envolveram disputas judiciais, lavação de roupa suja e a movimentação de bilhões de dólares. Mais do que isso, o que o diretor David Fincher desenha aqui não é o retrato, mas o perfil de uma geração.
Interpretado pelo jovem talento Jesse Eisenberg, de filmes como "Zumbilândia" e "A Lula e a Baleia", Zuckerberg é o exemplo dos chamados "bilionários acidentais", alcunha que também é o título do livro no qual o filme é baseado. Da mesma forma que outros gênios da internet, como o co-fundador do Napster, Sean Parker (vivido na tela pelo cantor Justin Timberlake), Zuckerberg chegou ao topo sem que ninguém percebesse. Exatamente como Fincher o mostra - recluso, solitário, com um ar meio autista de quem se importa apenas com o próprio mundo, se esgueirando pelos corredores e jardins do campus de Harvard, se escondendo atrás do laptop num canto da sala sem chamar a atenção - ele conseguiu tapear e vencer aqueles que sempre foram os mais bem sucedidos nas universidades americanas: os atletas.
No filme, os bonitões e grandalhões que o clichê do cinema enlatado sempre coloca no time de futebol americano são representados por dois irmãos gêmeos idênticos praticantes de remo. Fincher faz com que eles funcionem como alívio cômico, inclusive retomando o lado irônico de "Clube da Luta" ao brincar com a trilha sonora e a montagem em uma determinada sequência com os personagens. É também quando ele prova que os atletas deixaram de ser os mais populares da escola e se tornaram os losers, os perdedores. É "A Vingança dos Nerds" virando realidade.
Só que a história de Zuckerberg é trágica. E como diz Peter Parker em "Homem-Aranha", tudo começou com uma garota. Mas diferente do Cabeça de Teia, provavelmente o mais nerd dos super-heróis, Zuckerberg não tem nada de bom moço. Ele também não é um vilão. É alguém que parece ser incapaz de se relacionar, que simplesmente não sabe como ser um amigo ou um namorado, e que projetou no Facebook tudo aquilo que sempre quis ter. Ele criou uma vida social que só existia no mundo virtual. Ele confundiu números com pessoas, algorítimos com sentimentos, códigos com valores. Ao lado da exposição da privacidade e do roubo de propriedade intelectual, este é pelo menos um dos males deste novo século em que o digital e o virtual se impõem sobre nossas rotinas dia após dia. O que é incrível que "A Rede Social" mostra é que todas essas questões podem ser discutidas a partir dos atos de uma só pessoa: Mark Zuckerberg. Não há dúvidas de que ele merecia um filme, mesmo ainda tendo apenas 26 anos de idade.
A boa notícia, além de "A Rede Social" ser um grande filme, é que Fincher voltou a ser Fincher, depois do irregular "O Curioso Caso de Benjamin Button". O cineasta volta a se preocupar em discutir questões do nosso tempo e retoma o seu estilo visual, algo que se percebe, por exemplo, no uso dos filtros esverdeados ou azulados em determinadas cenas. Fincher também se mostra um cineasta amadurecido, que mantém a elegância no movimento da câmera e a composição absurdamente detalhista, que aproveita todos os cantos do quadro, sem desta vez recorrer a trucagens dispensáveis (como a câmera-inseto de "O Quarto do Pânico", que passa até mesmo por buraco de fechadura). Assim ele favorece a construção dos personagens e da narrativa. Fincher fez um filme menos eloquente que "Zodíaco", possivelmente sua obra-prima, mas não menos relevante dentro de sua obra.
A Rede Social (The Social Network, 2010, EUA)
direção: David Fincher; roteiro: Aaron Sorkin (baseado no livro de Ben Mezrich); fotografia: Jeff Cronenweth; montagem: Kirk Baxter, Angus Wall; música: Trent Reznor, Atticus Ross; produção: Dana Brunetti, Ceán Chaffin, Michael De Luca, Scott Rudin; com: Jesse Eisenberg, Rooney Mara, Andrew Garfield, Justin Timberlake, Armie Hammer, Josh Pence, Rashida Jones, Joseph Mazzello, Bryan Barter, Patrick Mapel; estúdio: Columbia Pictures, Relativity Media, Michael De Luca Productions, Scott Rudin Productions, Trigger Street Productions; distribuição: Columbia Pictures, Sony Pictures. 120 min
direção: David Fincher; roteiro: Aaron Sorkin (baseado no livro de Ben Mezrich); fotografia: Jeff Cronenweth; montagem: Kirk Baxter, Angus Wall; música: Trent Reznor, Atticus Ross; produção: Dana Brunetti, Ceán Chaffin, Michael De Luca, Scott Rudin; com: Jesse Eisenberg, Rooney Mara, Andrew Garfield, Justin Timberlake, Armie Hammer, Josh Pence, Rashida Jones, Joseph Mazzello, Bryan Barter, Patrick Mapel; estúdio: Columbia Pictures, Relativity Media, Michael De Luca Productions, Scott Rudin Productions, Trigger Street Productions; distribuição: Columbia Pictures, Sony Pictures. 120 min
3 comentários:
"escola - o útero da vida social"
Não seria a familia (pais, irmãos, primos, tios, avós, amiguinhos, etc), o "útero" da vida social, não?
Agora algo que acho estranho (obs. ainda ñ assisti A Rede Social): criticos de cinema criticarem: virtuosismo tecnico, criação de imagens/cenas visualmente (e até sonoras) impactantes, belas, "impossíveis" etc. Em geral eu adoro quando o cineasta, "cria" um novo angulo, um movimento diferente de camera, uma sequencia somente possivel no cinema, uma imagem belissima ( o ...E o vento levou, foi dos 1º que me impressionou pelos belos "quadros" com cores, luzes/sombras que buscavam ser belos, cinematograficos, mesmo) etc.
Putz, ñ vejo problema algum em um cineasta(artista) buscar o belo, o visualmente "diferente" da realidade (e sei que vc tbm, não, Renato, só estou refletindo um pouco sobre as "obrigações" do cinema/cineastas), mas é que vejo as vzs, uma marcação em cima de cineastas que não retratam seus filmes como documentarios, fotografando e filmando como "vida real", se atendo ao fisicamente possivel, sem "molecagem", como se somente cineastas que PARAM uma camera em frente aos atores, fossem "serios", maduros,etc...
putz isso ta ficando longo... acho q vou continuar no meu blog :)...
P.S. uma vez li uma critica do Rubens Ewald Filho, criticando a entrada do Jack Nicholson, no filme "As bruxas de Eastwick", como sendo "cinematogrtafica"... Putz, em um filme, no cinema, ele queria que a entrada fosse o que??? Literaria? teatral? Fotonovelesca?... porra... no cinema eu espero, e gosto de entradas cinematograficas, mesmo :)... adoro por exemplo, a entrada, apresentação de Harrison Ford no primeiro Indiana Jones.
(tem hora que eu desembesto a falar, hein, Renato... que dureza :) )
xlucas
http://womni.blogspot.com/
xlucas, falo por mim: quando critico essas inovações técnicas ou invencionismos de diretores, é porque são coisas feitas sem necessidade. A câmera-inseto do Fincher em "Quarto do Pânico" não tem função narrativa alguma. Está lá só para aparecer. Já no "Clube da Luta" considero todas as intervenções dele muito bem acertadas, inclusive as brincadeiras de "esconder" o Tylder Durden entre fotogramas. É tudo uma questão de ser coerente.
Quanto à escola, julgo ser o lugar onde formamos e desenvolvemos nossa vida social. A família, seguindo a analogia que fiz, seria a concepção. :)
Renato.
Vou assistir hoje o filme. Altas expectativas!
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