Você certamente já encontrou pelas ruas alguém que parece estar vagando pelo mundo. São mochileiros, ciganos, hippies, vendedores de miçangas de banco de praça. Se alguma vez você já parou para pensar de onde aquela pessoa veio, quem é a família dela, para onde ela quer ir ou o que foi a vida dela até ali, naquele instante em que ela cruzou o seu caminho, é provável que você goste de “Na Natureza Selvagem”. Agora, se você, em algum momento da sua vida, já desejou estar no lugar de uma dessas pessoas, se você, por qualquer motivo que seja, quis se desligar do mundo e viver por aí, numa jornada de auto-descoberta, de busca por alguma redenção... Bom, existem razões de sobra para que este filme te acompanhe por bastante tempo após o fim da projeção.
Todos sabemos que a sociedade é uma merda muitas vezes. Qualquer pessoa já deve ter sentido vontade de largar o emprego, o casamento, os pais, o país. Mas do sentir essa vontade até chutar de fato o balde, é preciso ter muita coragem. E é preciso ter também um tanto de humildade – isto é, saber reconhecer o seu próprio valor e também ter a capacidade de se fazer reconhecer. Esta é uma noção que muitas pessoas confundem com egoísmo, por parecer que apenas os interesses pessoais é que importam. Mas, pior do que ser egoísta, não é alguém pensar que sabe o que é melhor para o outro? Prisão ideológica é o pior tipo de prisão – é feita para você não perceber que está nela.
A rebeldia é comum em muitos de nós. Para alguns, é mais fácil se guiar por ela. Chris McCandless, o nosso protagonista aqui, foi com tudo em direção ao desejo de se libertar da sociedade e se encontrar com a vida. E para alguém que vive na ironia de não ter tempo nem mesmo para ver os ponteiros do relógio girarem por completo no dia-a-dia, acompanhar a viagem dele pelos Estados Unidos, na tentativa, não de sumir no mundo, mas de se sentir pertencente a ele, é algo magnético demais para não se criar um vínculo muito forte com esse personagem, não necessariamente com seus motivos, mas com aquela força que o move a buscar a liberdade.
Se para Chris a vida não se resume a tirar carteira de motorista, concluir uma faculdade, conseguir um emprego e bater cartão todo dia, Sean Penn também não parece se contentar com o cinema como um conjunto de regras prontas. Nesta sua quarta investida na direção (terceira como roteirista), Penn conta a história de Chris de uma maneira tão natural, que faz o filme fluir com naturalidade, além da formalidade estética com que muitos de nós estamos acostumados. Isso funciona porque Penn está muito seguro no jeito como filma: mesmo sendo liberal, ele consegue ser elegante, equilibrado e poético na construção das cenas. Usa zoom, acelera e reduz a velocidade, enquadra planos abertos e fechados, faz o protagonista olhar para a câmera sem culpa. Penn está em comunhão com Chris e quer que o espectador também esteja. Acho que este é um dos tipos de direção mais autênticos a que se pode chegar, porque praticamente faz sentir que a câmera se emociona junto com o personagem.
Alguns diretores parecem perder esse tipo de identidade com o tempo, como por exemplo Cameron Crowe, autor de filmes tão pessoais como “Digam o que Quiserem”, “Jerry Maguire” e “Quase Famosos”. “Na Natureza Selvagem” é o filme que “Elizabethtown” queria ter sido: um filme de viagem, uma jornada homérica, tanto no sentido de ser épica, quanto no de ser espontânea. É um filme que inspira, e acho que esses são os que acabamos levando conosco na bagagem pela vida.
Não vamos nos levantar agora e dizer que Sean Penn fez de Chris McCandless algum tipo de símbolo de uma geração, alguém que viveu e morreu para deixar uma mensagem e fazer seguidores. Os filmes nos dizem várias coisas e o que Penn nos diz aqui é que aquele rapaz fez apenas o que ele sabia que era melhor para ele. A coragem para fazer isso é talvez o melhor exemplo que ele deixou, apenas vivendo-o.
Todos sabemos que a sociedade é uma merda muitas vezes. Qualquer pessoa já deve ter sentido vontade de largar o emprego, o casamento, os pais, o país. Mas do sentir essa vontade até chutar de fato o balde, é preciso ter muita coragem. E é preciso ter também um tanto de humildade – isto é, saber reconhecer o seu próprio valor e também ter a capacidade de se fazer reconhecer. Esta é uma noção que muitas pessoas confundem com egoísmo, por parecer que apenas os interesses pessoais é que importam. Mas, pior do que ser egoísta, não é alguém pensar que sabe o que é melhor para o outro? Prisão ideológica é o pior tipo de prisão – é feita para você não perceber que está nela.
A rebeldia é comum em muitos de nós. Para alguns, é mais fácil se guiar por ela. Chris McCandless, o nosso protagonista aqui, foi com tudo em direção ao desejo de se libertar da sociedade e se encontrar com a vida. E para alguém que vive na ironia de não ter tempo nem mesmo para ver os ponteiros do relógio girarem por completo no dia-a-dia, acompanhar a viagem dele pelos Estados Unidos, na tentativa, não de sumir no mundo, mas de se sentir pertencente a ele, é algo magnético demais para não se criar um vínculo muito forte com esse personagem, não necessariamente com seus motivos, mas com aquela força que o move a buscar a liberdade.
Se para Chris a vida não se resume a tirar carteira de motorista, concluir uma faculdade, conseguir um emprego e bater cartão todo dia, Sean Penn também não parece se contentar com o cinema como um conjunto de regras prontas. Nesta sua quarta investida na direção (terceira como roteirista), Penn conta a história de Chris de uma maneira tão natural, que faz o filme fluir com naturalidade, além da formalidade estética com que muitos de nós estamos acostumados. Isso funciona porque Penn está muito seguro no jeito como filma: mesmo sendo liberal, ele consegue ser elegante, equilibrado e poético na construção das cenas. Usa zoom, acelera e reduz a velocidade, enquadra planos abertos e fechados, faz o protagonista olhar para a câmera sem culpa. Penn está em comunhão com Chris e quer que o espectador também esteja. Acho que este é um dos tipos de direção mais autênticos a que se pode chegar, porque praticamente faz sentir que a câmera se emociona junto com o personagem.
Alguns diretores parecem perder esse tipo de identidade com o tempo, como por exemplo Cameron Crowe, autor de filmes tão pessoais como “Digam o que Quiserem”, “Jerry Maguire” e “Quase Famosos”. “Na Natureza Selvagem” é o filme que “Elizabethtown” queria ter sido: um filme de viagem, uma jornada homérica, tanto no sentido de ser épica, quanto no de ser espontânea. É um filme que inspira, e acho que esses são os que acabamos levando conosco na bagagem pela vida.
Não vamos nos levantar agora e dizer que Sean Penn fez de Chris McCandless algum tipo de símbolo de uma geração, alguém que viveu e morreu para deixar uma mensagem e fazer seguidores. Os filmes nos dizem várias coisas e o que Penn nos diz aqui é que aquele rapaz fez apenas o que ele sabia que era melhor para ele. A coragem para fazer isso é talvez o melhor exemplo que ele deixou, apenas vivendo-o.
nota: 10/10 -- veja no cinema e compre o DVD
Na Natureza Selvagem (Into the Wild, 2007, EUA)
direção: Sean Penn; com: Emile Hirsch, Marcia Gay Harden, William Hurt, Jena Malone, Brian H. Dierker, Catherine Keener, Vince Vaughn, Kristen Stewart, Hal Holbrook; roteiro: Sean Penn (baseado no livro de Jon Krakauer); produção: Art Linson, Sean Penn, William Pohlad; fotografia: Eric Gautier; montagem: Jay Cassidy; música: Michael Brook, Kaki King, Eddie Vedder; estúdio: Paramount Vantage, Art Linson Productions, River Road Entertainment; distribuição: Paramount Pictures. 148 min
direção: Sean Penn; com: Emile Hirsch, Marcia Gay Harden, William Hurt, Jena Malone, Brian H. Dierker, Catherine Keener, Vince Vaughn, Kristen Stewart, Hal Holbrook; roteiro: Sean Penn (baseado no livro de Jon Krakauer); produção: Art Linson, Sean Penn, William Pohlad; fotografia: Eric Gautier; montagem: Jay Cassidy; música: Michael Brook, Kaki King, Eddie Vedder; estúdio: Paramount Vantage, Art Linson Productions, River Road Entertainment; distribuição: Paramount Pictures. 148 min
19 comentários:
Apenas um lembrete aos leitores:
O filme já está disponível em DVD nas locadoras. Como provavelmente este é o melhor filme do ano que a maioria não viu (chegou ao Brasil com um número ridículo de cópias no cinema), creio que muitos de vocês só vão conhecê-lo agora, em casa. Assim, acho que a minha demora em publicar esta crítica não foi de todo um mal.
[]s!
Posso estar sendo meio piegas, mas afirmo com alegria que esse filme tocou a minha alma. Belíssimo.
E, Renato, cadê a crítica de Indy?
Aê Renatão, tô te adicionando no Multiplot!. Tá rolando um especial da série Indiana Jones por lá, dá uma olhada.
Abraço!
Daniele, estou trabalhando no texto do Indy neste momento. Mas só devo publicá-lo na quarta, porque quero vê-lo novamente. E que bom que o "Into the Wild" te tocou também. :)
Luis, valeu, cara. Eu vou dar uma passada com mais tempo no teu blog para conferir todos os textos.
[]s!
Como cinéfilo, um filme destes já é maravilhoso!
Como mochileiro (de dormir em albergues, mochila nas costas e tudo mais), este e Diários de Motocicleta (que passa por lugares que conheço, e revejo sempre que quero fazer uma nova viagem) são "filmes de cabeceira".
Não existe nada melhor do que pegar a mochila e sair por aí. A diferença é que eu ainda volto depois de 2, 3 ou 4 semanas, enquanto este teve coragem para sair sem rumo e sem hora de voltar...
Adianta aí, Renato.
Gostou do Indy???
Também gostei muito. E acho que esse filme foi um dos grandes injustiçados do último Oscar. Desnecessário dizer que a trilha segue tocando aqui em casa.
Abração
Danielle, na quarta você vai descobrir. ;)
[]s!
Ai... droga
:D
Eu não consigo gostar muito deste filme. Acho a narração fake, literária demais...
Estou fazendo uma revisão geral nos filmes dessa década para uma lista de melhores 2000-2009, começando por 2000.
Você tem as listas de melhores de cada ano arquivado que possa me mandar (email: faeeeu@gmail.com, comentário no meu blog) ?
Obrigado
Bem, tá certo que é admirável alguem que busca a independencia das convenções de nossa sociedade capitalista, porém esse Chris não só falhou nesse intento, pois acabou tendo que correr atrás de "bicos" nessa mesma sociedade para sobreviver, como, o que é pior em minha opinião, tornou-se um parasita da mesma, ao viver de favor com várias pessoas, recorrer ao sistema de seguro social do país, precisar de recorrer a maquinas criadas por essa mesma sociedade que ele repudia (armas, o "magic bus", etc.). E por fim o fracasso final... a morte. Pó, faltou um mínimo de planejamento. Um cara com formação superior que age como um garotinho mimadinho recem saido da pré-escola que quer fugir para o parquinho do bairro.
Enfim, como intenção, até louvavel, mas pateticamente realizada e definitivamente um exemplo a não ser seguido.
Legal seria se ele fosse para o "mato" e se desvinculasse totalmente da sociedade e vivesse unica e exclusivamente da natureza (caça, pesca...) Porém creio ser praticamente impossível isso para o homem atual. Não é atóa que a humanidade é gregária, busca viver em sociedade. Se unir foi o que nos proporcionou sobreviver a a natureza inóspita. Embora realmente dê vontade de "sumir" as vezes.
Bem, é só minha opinião.
xlucas
P.S. Será que o Renato lê (fica sabendo) (d)esses comentarios postados em posts mais antigos??
Por acaso eu estava passando por esta página e vi seu comentário, xlucas.
Brincadeirinha! Fico sabendo, sim, porque o blogger envia e-mail sempre que tem um novo comentário. ;)
Quanto ao que você disse sobre o Chris, concordo que faltou planejamento. Mas acho que ele mesmo se dá conta disso no fim e a morte foi o preço caríssimo que ele pagou. Não acho também que é um exemplo a ser seguido. Me identifico mais com a dor da alma dele, digamos. E com a lição que ele aprende tarde demais.
[]s!
Obrigado, Renato , pela atenção.
Achei que eu pudesse tá falando com as "paredes", afinal que graça tem conversar com ninguem!? :>)
Se bem que eu falo pra caramba sozinho, comigo mesmo, e em voz alta as vzs... brigo, discuto, "ganho discussões que havia perdido com outras pessoas...coisa de maluco mesmo :>).
Valeu;
xlucas
xlucas, eu também tenho essa mania de falar sozinho. E o pior é quando te pegam, né? hehehe
[]s!
Realmente... é aquele "mico".. e eu que alem de falar ainda gesticulo... aí quando alguem flagra.. é aquela reação rídicula de querer passar a imprenssão que tava coçando cabeça, coçando as costas, pegando alguma coisa no chão, espreguiçando :>)
Enfim... "Micão" total... vc "acha" que convenceu a pessoa de que não é maluco e ela finge que não percebeu que vc é maluco mesmo... ai! ai!
xlucas
Renato,
Dou aulas para o ensino médio e passei esse filme para os meus alunos.Estou querendo usar seu texto para discutir algumas partes do filme.
Naturalmente, colocarei que o texto é de sua autoria, com o endereço do blog e tal. Então, posso usar o texto ou há algum problema pra você? Ah, ressalto que é apenas na sala de aula, pra facilitar a didática mesmo, não é pra nada além disso hehe
Abraços,
Deivisson
Sem problemas, Deivisson. Aliás, é uma honra.
[]s!
Muito obrigado, Renato.
Certamente o texto vai ser de muita valia.
Abraço,
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